Luciano de Antioquia

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São Luciano
de Antioquia
Hieromártir

Ὁδοὶ δύο εἰσί·
μία τῆς ζωῆς,
ϗ μία τοῦ θανάτου.


Esse artigo faz parte de uma série sobre os
Santos do Cristianismo Primitivo
Século I
AbílioDionísioHieroteuLeuco, Calínico e Ciríaco
LídiaNicandroPancrácioProcesso e Martiniano
Torpes e EvélioZenaide e Filonila
Século II
BucólioEleuthériosFelicidadeGlicériaHegésipo
InácioJacintoLeonilaParaskeví
PolicarpoProclo e Hilário
Século III
Dez de CretaÁgataAglaida e BonifácioAlexandre
Cipriano e JustinaEspiridiãoNicéforoPansófio
Perpétua e FelicidadePolieuto e Nearco
TatianaTemístocles
Século IV
Jorge, o Vitorioso
Quarenta de SebasteBárbaraCatarinaCiro e João
ClementeDimitriosElianEufêmiaEugênio
Eulália e JúliaLucianoPanteleimonProcópioTeodoro
Trófimo e Teófilo

O Santo Hieromártir Luciano de Antioquia (séc. IV) foi um sacerdote martirizado pela Fé durante a Grande Perseguição. Zeloso na pureza das Sagradas Escrituras, dedicou seus estudos a corrigir todas as adulterações promovidas pelas seitas de seu tempo, e formou legiões de combatentes por Cristo através de sua vida ascética dentro da cidade, motivo pelo qual causou a inveja de outros sacerdotes, os quais entregaram-no aos pagãos.

Vencendo a divina luta dos mártires no dia 7 de janeiro, desde o primeiro milênio São Luciano e suas dezenas de companheiros são comemorados pela Igreja no dia 15 de outubro, data da consagração de sua igreja em Antioquia pela santa Imperatriz Helena. Sua discípula, a Santa Virgem e Mártir Pelágia, é comemorada no dia 8 de outubro.

Vida

Luciano nasceu próximo ao ano de 240 na cidade de Samósata, às margens do Rio Eufrates (atual Samsat no sul da Turquia). Filho de pais cristãos, Luciano era descendente dos assírios convertidos e batizados na Fé verdadeira pelos apóstolos no século anterior e que, agora, formavam uma grande comunidade, embora tivessem que exercer a Fé nas catacumbas, longe da maioria pagã de Samósata. Ainda assim, os martirológios parecem sugerir que os cristãos dessa cidade foram poupados da Perseguição do Imperador Décio (249–251). Desejando fornecer-lhe uma boa educação secular, seus pais enviaram-no para grandes escolas, e Luciano destacava-se dos outros alunos em seus estudos.

Porém, a principal educação que o jovem recebia era nas catacumbas. Sempre atento às poucas Sagradas Escrituras que a Igreja de Samósata possuía, Luciano desenvolveu um grande desejo pela vida ascética e pelo estudo da Sagrada Tradição. Naquele tempo, o monasticismo ainda não havia sido estabelecido, mas Luciano fez o que podia para viver de forma austera.

Distribuindo todos os seus bens aos necessitados, Luciano usou sua educação para compilar instruções na vida cristã, alimentando-se noeticamente de seu próprio trabalho. Seu maior presente à Igreja de Samósata foi a correção das Sagradas Escrituras propositalmente adulteradas pelos judeus e pelas seitas gnósticas. Comparando os textos em hebraico com a Septuaginta, Luciano identificou as passagens reescritas pelos judeus para subverter as profecias sobre a vinda de Cristo e as adições dos gnósticos para fazerem de Cristo um de seus aderentes.

Logo seu renome chegou à grande cidade de Antioquia, e a aclamação popular pedia ao arcebispo que trouxesse-o para o clero. Isso provavelmente aconteceu na década de 280, após um sínodo composto por dezenas de bispos excomungar do trono antioquino o herético Paulo I (c. 261–268) que, além de não acreditar na Trindade, promovia uma vida de luxos e fortunas como algo cristão, embora tivesse nascido em uma família humilde na mesma Samósata de São Luciano. Paulo foi sucedido pelo ortodoxo Domno I (268–273) e, mais tarde, por Timeu (273–280).

Conhecendo o renome do santo conterrâneo, o então Arcebispo Paulo falsamente proclamou que São Luciano também era adocionista, heresia a qual Paulo pertencia. Os aderentes dessa seita afirmavam que Jesus Cristo não era co-eterno com o Pai, e que Sua divindade não existia antes de Seu Batismo, mas sim que Ele havia sido “adotado” pelo Pai. A teologia dessa seita não terminava em Deus, mas ia ao ponto de negar a Virgindade da Mãe de Deus.

A profissão de Fé

Isso provocou uma grande amargura em São Luciano, pois, à medida que estudava, percebia que alguns de seus escritos estavam contaminados com heresias, antes tidas como verdades pelos seus mestres. Em 285, já na era do Arcebispo Cirilo I (280–303), sucessor de Timeu, São Luciano publicamente escarneceu as heresias, porém as seitas espalhavam seus textos por várias cidades como forma de indicar que o santo era um deles, e isso chegou até o Egito.

Em 289, trinta anos antes da promulgação do primeiro Credo, São Luciano publicou sua confissão de Fé, pela qual expõe todas as suas crenças. É importante relembrar que a Igreja viveu sob perseguição ininterrupta até 325, e nenhum concílio universal que impusesse cânones e dogmas havia sido realizado antes dessa data. Dessa forma, qualquer ensinamento que não fosse contemplado pela Didaquê dos santos apóstolos dependia da própria educação do fiel para ser considerado verdadeiro ou herético.

Creio, de acordo com a Tradição evangélica e apostólica, em Um só Deus, Pai Onipotente, Criador e Provedor de todas as coisas. E em Um só Senhor, Jesus Cristo, Filho Unigênito de Deus, por Quem todas as coisas foram feitas, nascido do Pai antes de todos os séculos. Deus de Deus, Completo de Completo, Uno de Uno, Perfeito de Perfeito, Rei de Rei, Senhor de Senhor, Verbo Vivo, Sabedoria, Vida, Luz Verdadeira, Caminho, Verdade, Ressurreição, Pastor, Portão, Imutável e Inalterável, imutavelmente Semelhante à Divindade, igual em substância, vontade, poder e glória ao Pai, Primogênito de toda a criação, presente com Deus desde o começo, Verbo de Deus, de acordo com a proclamação evangélica: “e o Verbo era Deus”, por Quem todas as coisas foram feitas e de Quem todas as coisas consistem. Que, nos últimos dias, desceu dos Céus e Se encarnou numa Virgem, de acordo com as Escrituras, e Se fez Homem, Mediador entre Deus e o homem, Apóstolo de nossa Fé e Príncipe da Vida, porquanto diz: “Desci dos Céus não para fazer a Minha Vontade, mas a Vontade d’Aquele que Me enviou”, que padeceu por nós e ressuscitou ao terceiro dia, e subiu aos Céus, e sentou-Se à direita do Pai, e novamente virá com glória e poder para julgar os vivos e os mortos. E no Espírito Santo, dado para a consolação, santificação e perfeição daqueles que creem, como também nosso Senhor Jesus Cristo comandou Seus discípulos, dizendo: “Ide e anunciai a todas as nações, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”, claramente de um Pai que é pai, e de um Filho que é filho, e de um Espírito Santo que é espírito santo, sendo esses nomes atribuídos, não vagamente nem ociosamente, mas indicando com precisão a personalidade (hipóstase), ordem e glória especial dos nomes, de modo que em personalidade sejam três, mas em harmonia sejam Um.

São Luciano conclui sua profissão com o seguinte parágrafo:

Tendo, portanto, essa Fé, tanto do começo como ao fim, perante Deus e Cristo, seja anátema toda doutrina herética e falsa. E se alguém, em desacordo com a Fé Verdadeira das Escrituras, ensina e proclama que houve ou há um período, ou tempo, ou século antes do Filho de Deus ter nascido, seja anátema. E se alguém dizer que o Filho é uma criatura como qualquer uma das outras, ou gerado como qualquer um dos outros gerados, ou criado como uma das coisas criadas, e não como as Divinas Escrituras transmitiram sobre cada uma das coisas anteriores, ou se alguém ensina ou prego um Evangelho além dos que nos foram recebidos, seja anátema. Pois verdadeira e claramente cremos e seguimos todas as coisas das Sagradas Escrituras, as quais foram transmitidas para nós pelos profetas e apóstolos.

Reconciliado com a Igreja, São Luciano foi convidado pelo Arcebispo Cirilo para a Arquidiocese de Antioquia, ordenando-o ao Santo Sacerdócio.

O sacerdote de Antioquia

São Luciano era um exemplo para todos os cristãos de Antioquia. Suas homilias refletiam a Luz das Sagradas Escrituras e preservavam os fiéis de caírem nas várias heresias daqueles tempos. O santo advogava pela comunhão frequente, lembrando dos mártires que, mesmo passando por uma longa batalha, não rendiam seus espíritos até receberem os Santos Dons. As crianças amavam-no, mas a principal admiradora de São Luciano era uma garota de apenas quinze anos, chamada Pelágia. Através dos ensinamentos transmitidos por São Luciano, Pelágia decidiu preservar sua virgindade e oferecer toda a sua vida a Cristo.

O santo pregou por cerca de trinta anos em paz, mas não sem acumular inimigos, muitos destes sendo os próprios membros do clero. Em 303, o Imperador Diocleciano (284–305) iniciou a maior e mais cruel Perseguição aos cristãos, e os inimigos de São Luciano rapidamente denunciaram-no. Seu rebanho foi asperamente perseguido pelas forças de Diocleciano, e até as crianças que se recusassem a comer os alimentos aspergidos no sangue dos sacrifícios aos ídolos pagãos eram raptadas e martirizadas em caldeirões ferventes. Quanto à jovem Pelágia, toda a sua longa vida agradável a Deus que tinha pela frente acabou no momento em que os inimigos de São Luciano revelaram sua morada e suas ambições aos oficiais de Diocleciano, os quais despacharam soldados para destruírem sua virgindade. Assim que arrombaram a porta de sua casa, Pelágia, vestindo-se como noiva de Cristo que era, subiu ao último andar de sua casa e dele se jogou, adentrando as câmaras nupciais celestes aos quinze anos de idade como um sacrifício imaculado ao seu Esposo, para junto d’Ele pelos séculos dos séculos reinar. Santa Pelágia é comemorada pela Igreja no dia 8 de outubro.

São Luciano permaneceu com alguns fiéis que tomaram refúgio fora da cidade, mas um certo Pancrácio, sacerdote da Igreja de Antioquia que nutria uma profunda inveja contra o santo, negociou com os soldados ser libertado em troca de revelar onde São Luciano estava escondido.

O caminho a Nicomédia

São Luciano foi preso pela guarda de Diocleciano e, devido à sua importância, não foi levado ao governador da Celessíria (a província cuja capital era Antioquia), mas sim ao próprio tribunal de Diocleciano em Nicomédia. Durante o caminho de Antioquia a Nicomédia, que passava pela Cilícia e pela Capadócia, tamanha era a santidade daquele já idoso sacerdote que os próprios soldados eram cativados pelas suas palavras. A cada cidade que passavam, um dos soldados declarava-se cristão em alta voz, sendo logo preso pelos seus superiores. Ao todo, mais de quarenta soldados se converteram ao lado de São Luciano e adentraram o Reino dos Céus como santos mártires por Cristo.

Quando finalmente chegaram a Nicomédia, São Luciano foi interrogado e instado a oferecer sacrifícios para o bem-estar do imperador, pois só assim poderia salvar sua vida. O santo, porém, confessou-se cristão, proclamou o Reino Celeste de Cristo e envergonhou os pagãos com seus discursos, os quais o próprio Espírito Santo falava através de sua boca. Grunhindo de raiva como demônios, os juristas julgaram o santo como blasfemador de seus deuses, e condenaram-no a cruéis açoites e chicotes, apesar de sua idade. Em todos esses tormentos, São Luciano louvava a Deus e agradecia-O por fazê-lo digno de sofrer pela Verdadeira Fé em Cristo.

Vendo-o irresoluto em sua confissão de Fé, os magistrados trancaram-no na prisão e proibiram os carrascos de trazerem-no comida. Embora pensassem que o santo não resistiria à fome e abandonaria sua Fé para salvar-se da morte, a verdade é que São Luciano já havia conquistado o seu estômago pelos seus extensos jejuns, de forma que a gula já não era para ele uma paixão.

O santo confessor passou semanas trancado em sua cela sem receber uma única migalha de pão, nutrindo sua alma através da oração incessante. Em um 6 de janeiro, dia da Festa da Teofania de Cristo Deus, São Luciano chegou ao fim de sua batalha, sabendo que sua morte era iminente. Pela Divina Providência, um cristão que visitava a prisão entregou secretamente pão e vinho aos confessores.

Todos os cristãos presos vieram até o padre Luciano, e ele lhes pediu que cercassem-no e colocassem o pão e o frasco de vinho em cima de seu corpo. Deitado e sem mais forças para se levantar, São Luciano ofereceu-se como um altar a Deus. Todos rogaram diante do pão e do vinho, e São Luciano pediu a Deus que aceitasse aquele sacrifício de louvor. Então, iniciou a Santa Anáfora, mencionando as palavras de Cristo aos apóstolos na Divina Ceia Mística e suplicando pela decida do Espírito Santo sobre aqueles dons. Tendo todo o seu rebanho em sua mente, São Luciano falou o Pai Nosso e ofereceu a Santa e Divina Comunhão a si e a todos os cristãos presentes.

No dia seguinte, foi decidido que São Luciano fosse novamente levado às torturas físicas. Quando os soldados abriram o cárcere do ancião, ele deu um brado, exclamando: “Eu sou cristão! Eu sou cristão! Eu sou cristão!” e, caindo sem forças ao chão, entregou sua alma a Deus com mais de sessenta anos de idade, partindo para perpetuamente servir a Divina Liturgia nas Alturas do Reino dos Céus ao lado de seu Criador.

Pós-vida

Com o fim da Grande Perseguição e a vitória de São Constantino (306–337) sob os imperadores pagãos em 312, a memória de São Luciano passou a ser comemorada anualmente em 7 de janeiro pelos cristãos sírios. Porém, mesmo tendo gloriosamente sido chamado por Cristo para compor a nuvens dos mártires, os inimigos da Fé não se deixaram por vencidos e, selecionando trechos dos ensinamentos do santo, maliciosamente davam novas interpretações à sua doutrina.

Os arianos fizeram um extenso uso dessas interpretações para tentar provarem-se livres de heresia, a ponto do próprio Santo Alexandre I, Patriarca de Alexandria (313–328), um exímio combatente das heresias que sujavam o Egito, proclamar que São Luciano era o “pai do arianismo”. Essa triste declaração era justificada devido às grandes calúnias que o sacerdote sofria postumamente, à ignorância inocente de Santo Alexandre e seu empenho em erradicar todo ensinamento indigno de Cristo.

Mesmo assim, a santa Imperatriz Helena, mãe de São Constantino, financiou a construção de uma igreja dedicada ao hieromártir em Antioquia, transferindo as relíquias de São Luciano para o seu altar. Esse evento foi grandemente celebrado pelos cristãos, e mais uma data foi adicionada ao calendário litúrgico para honrar essa consagração, feita num 15 de outubro.

No ano de 341, um concílio do Patriarcado de Antioquia ratificou a santidade do sacerdote, fazendo com que sua aceitação como santo fosse finalmente expandida para os outros patriarcados. Mais tarde, com a universalização da Festa de São João, o Batista, em 7 de janeiro, e a grande quantidade de hinos compostos para essa festividade, os ofícios divinos levavam horas para serem concluídos, e a lembrança de São Luciano passava quase que despercebida em meio a tantos hinos para São João. Por isso, as igrejas da Síria decidiram transferir os ofícios de São Luciano de 7 de janeiro e mesclá-los com os do dia da consagração de sua igreja, no 15 de outubro. Consequentemente, os novos sinaxários passaram a listá-lo somente nessa data.

Curiosamente, a devoção de alguns iconógrafos a São Luciano faziam-nos grafá-lo vestindo um felônio e um omofório, tecidos apropriados apenas para hierarcas. Na iconografia, isso já ocorreu com São Haralambos, devido à importância que o santo tinha para determinada comunidade.

Hinos

Tropário

(Tom III)

Resplandecendo com o Espírito, ensinastes o puro conhecimento da Fé Verdadeira. E sendo instrutor dos mártires, ó Luciano, foste glorificado na disputa. Intercede a Cristo nosso Deus, para que conceda às nossas almas a grande misericórdia.

Kontakion

(Tom II)

Nós, fiéis, gloriosamente aclamamos a ti com hinos, ó Luciano, lamparina mais radiante, que resplandeceste inicialmente no asceticismo, e mais tarde brilhando na competição divina. Intercede sem cessar por todos nós.

Louvor

(Por São Nikolai, Bispo de Ohrid)

Luciano, o mais sábio dos ascetas e escribas,
corajosamente seguiu o caminho de Cristo em vida.
Contra a heresia e as trevas da idolatria,
Luciano, o vitorioso, enfrentou sua amarga agonia.
Alicerçado firmemente nas fundações da Santíssima Trindade,
Pai, com o Espírito e o Filho pela eternidade,
Luciano glorificou a Deus em palavra e ação,
e seu sangue inocente testemunha essa afirmação.
A Roma dos selvagens ruiu, as heresias morreram,
as obras imorais e vergonhosas pereceram,
Cristou recebeu os mártires como Seus,
e a Fé, grande e gloriosa, prevaleceu.
Esse é o Reino dos santos, o Reino sem fim,
o qual Daniel outrora profetizou, e Cristo fundou,
Reino tão desejado, que da terra se separou,
com cúpulas douradas e viçosos jardins.
E quanto a São Luciano, que na messe muito labutou,
como operário desse Reino, por ele tudo entregou,
e agora nele reina com glória ao lado de seu Jesus,
tomado por Deus para o rebanho do Reino de Luz.