Alterações

Ir para: navegação, pesquisa

Xenofonte de Constantinopla

22 bytes adicionados, 04h36min de 16 de junho de 2020
Vida
A estas palavras, João e Arcádio rogaram: “Pai, não nos abandone, peça a Deus por mais tempo! O Senhor certamente atenderá ao seu pedido. Se é para que nós avancemos na virtude, precisaremos de ti para nos guiar, pois ainda somos muito jovens.” Xenofonte suspirou e, em muitas lágrimas, disse: “Desde quando Deus visitou-me com esta enfermidade e tive de ser confinado nesta cama, tenho orado incessantemente para que Ele me permita mais tempo em razão de vossa juventude… Desejo vê-los atingirem a perfeição.”
Naquela noite, Xenofonte sonhou que Deus havia prolongado os seus dias na terra. Ao despertar, informou sua família sobre o sonho, e todos se alegraram e deram graças a Deus. Sua saúde estava melhorando consideravelmente, e Xenofonte instruiu-os: “Meus filhos, retornem retornai aos seus vossos estudos. Quando conclui-los, voltemvoltai, e arranjarei um casamento para vós.”
=== Naufrágio ===
Arcádio acordou, e crendo em seu sonho, regozijou-se e deu graças a Deus. “Caso volte para a casa de meus pais sem meu irmão, não trarei nada a eles senão a tristeza. Caso volte a Beirute e termine meus estudos na filosofia, para então voltar para casa sem ele, apenas tardarei a tristeza deles. Que hei de fazer? Meu pai muitas vezes exaltou a vida ascética, que traz o homem para perto de Deus. Logo, resta-me partir para o monasticismo!”
Depois de mais uma oração, Arcádio partiu para Jerusalém. Tendo venerado os lugares santos, partiu para o foi em direção ao deserto em busca de um mosteiro. No caminho encontrou um monge de aparência venerável e adornado de cabelos grisalhos. Caindo aos seus pés e beijando-os, implorou: “Santo pai, eis que estou muito abatido, não me esqueças em tuas orações!”
O monge respondeu-o: “Não te entristeças, meu filho, teu irmão está vivo. Ele e os vossos escravos foram salvos por Deus, e já entraram em vários mosteiros. Inclusive, João já foi tonsurado monge. Tua oração foi ouvida: em breve verás o teu irmão.” Assombrado, Arcádio novamente caiu aos pés do clarividente, e exclamou: “Deus revelou-lhe tudo sobre mim! Não me rejeites, leva-me a um mosteiro e salva a minha alma!”
O monge, que havia-o reconhecido primeiro, admitiu: “Sim, sou eu. Nós dois nos conhecemos e ambos fomos escravos de Xenofonte.” E o servo: “Como, então, estás vestido como um monge, e onde estão nossos amos João e Arcádio? Diz a mim o que sabes, pois procurei-os por toda a parte, e não encontrei nem seus vestígios!” Os olhos do monge encheram-se de lágrimas, e ele suspirou: “Nossos mestres e todos os outros que estavam na embarcação morreram, exceto a mim. Em meu juízo, julguei ser melhor concluir os meus dias num mosteiro do que levar uma notícia tão triste aos nossos amos.” O servo, chorando e batendo no peito, disse:
: “Ai de mim! Que terrível foi o vosso destino, meus mestres! Que sofrimento! Que horrível maneira de morrer! Como poderei eu informar vossos pais disso e suportar as lágrimas de vosso pai e as dores de vossa mãe, isso sem contar seus gritos de lamentação? Ai de mim, meus bondosos mestres; convosco, minhas esperanças pereceram! Pensava eu que herdaríeis tudo o que pertence aos vossos pais, e nós, os escravos, ansiávamos por um futuro feliz. Os pobres aguardavam pelas esmolas, os estrangeiros pela hospitalidade, as igrejas pelos adornos, os mosteiros pelas provisões, mas tudo foi em vão; que farei eu? Como poderei enfrentar meu amo Xenofonte com a notícia de que seus filhos morreram no mar? Ambos expirarão ao ouvir isso. É melhor que eu abandone minha missão e fuja, a ser responsável pelas suas mortes!
O escravo continuava insistindo em não retornar a Constantinopla, e os viajantes que os ouviam da pousada começaram a dizer: “Deves dizer a verdade aos teus mestres, pior será se eles invocarem o castigo divino sobre ti! A morte súbita pode cair sobre ti, e poderás perder tua salvação.” Vencido, o servo pôs-se a caminho novamente para Constantinopla. Ao chegar, entrando na casa, sentou-se em silêncio, abatido e com a cabeça baixa.
Quando Maria viu-o, correu até ele e perguntou-o lhe como estavam seus filhos. O servo disse-a que estavam bem. Quando foi perguntado sobre suas cartas, apenas respondeu que as havia perdido no caminho. Perturbada, Maria exclamou: “Pelo amor de Deus, diz-me a verdade! Minha alma está se debatendo e minhas forças estão se extinguindo!” O servo começou a chorar, e contou-a tudo. “Ai de mim, minha senhora, as luzes de tua vida se expiraram no mar… A embarcação que levava teus filhos naufragou, e todos afogaram-se!”
Maria, que tinha uma firme confiança em Deus, permaneceu sob controle. Não desmaiou e nem gritou, mas somente disse: “Bendito seja nosso Deus, pois isso foi feito segundo a Sua Vontade. Bendito seja o Nome do Senhor agora e sempre. Não contes isso a mais ninguém. O Senhor deu, e o Senhor tirou. Ele sabe o que é melhor para nós.”
Três horas depois, Xenofonte retornou do palácio imperial, acompanhado de uma enorme comitiva. Após dispensar seus assistentes, cortou uma fatia de pão para o jantar. Isso porque Xenofonte comia uma só vez por dia, depois do pôr do sol. Maria juntou-se a ele na mesa e anunciou: “O escravo voltou de Beirute…” Xenofonte disse: “Deus seja louvado. Onde ele está?” Maria contou-o que o escravo estava descansando, pois havia ficado enfermo. Ao ser questionada sobre as cartas, Maria respondeu-o: “Descansa agora e come. Amanhã verás as cartas. O servo tem muito a dizer sobre nossos filhos.”
Xenofonte protestou: “Traz-me as cartas! Quero saber como estão os nossos filhos. Posso falar com o escravo amanhã.” Então, Maria, incapaz de se conter, irrompeu-se em lágrimas. Xenofonte ficou apreensivo, e perguntou: “O que é, meu amor? Por que estás a chorar? Eles ficaram doentes?” Maria, engasgando-se em lágrimas, respondeu: “Quem dera que eles estivessem doentes! Nossos queridos filhos pereceram no mar!”
Maria concordou, e os piedosos pais começaram a fazer os preparativos para a viagem. Emitiram as instruções ao mordomo e distribuíram esmolas aos necessitados. Então, levando consigo ouro para suas despesas e para caridade, partiram ao longo caminho até Jerusalém. Quando chegaram à Cidade Santa, visitaram os lugares sagrados, distribuindo grandes quantias aos pobres pelo caminho. Em seguida, foram aos mosteiros da região para perguntar sobre seus filhos. Não obtendo êxito, conseguiram encontrar um dos escravos que estava no naufrágio e tornou-se monge. Imediatamente abraçaram-no, beijaram-no e jogaram-se aos seus pés. O monge, prostrado, se opôs: “Mestres, isso é muito indecoroso… Pelo amor de Deus, não vos rastejeis perante o vosso servo!”
Xenofonte insistiu: “Nós temos o mais profundo respeito pelo monasticismo. Não fiques triste, mas diz-nos tudo o que puder sobre os nossos filhos!” Os olhos do monge encheram-se de lágrimas, e ele disse: “Nossa embarcação naufragou, e cada um segurou-se numa tábua. A tempestade nos separou um do outro; não sei se mais alguém foi salvo, mas apenas que cheguei à costa de Tiro na Fenícia.”
Os dois despediram-se do monge, recompensando-o generosamente e pedindo-lhe que rezasse orasse por eles e pelos seus filhos. Depois, desceram à Jordânia, com a intenção de encontrar um lugar para orar e dar esmolas por lá. No caminho, cruzaram-se com o mesmo ancião clarividente que há quase três anos havia tonsurado Arcádio e, caindo aos pés do monge e implorando por suas orações, o ancião os anunciou: “Foi o amor pelos filhos que trouxe meus senhores Xenofonte e Maria a Jerusalém. Não entristeçais: vossos filhos estão vivos. Deus já vos revelou em sonho a glória que os espera nos Céus. Ide, operários da videira do Senhor, orai no Jordão e voltai à Cidade Santa. Tornareis a ver vossos filhos.” O ancião, então, continuou seu caminho a Jerusalém, e o casal, maravilhado, dirigiu-se ao Rio Jordão.
Pela Divina Providência, João, que havia peregrinado do mosteiro próximo de Malmefetânia à Cidade Santa, encontrou o ancião descansando próximo ao Gólgota, na Igreja do Santo Sepulcro. Ao entrar na igreja, João prostrou-se diante do ancião, o qual imediatamente saudou-o, abençoou-o e perguntou: “Por onde estiveste, mestre João? Teu pai e tua mãe estão à tua procura, e tu vieste à procura do teu irmão.”
Dois dias depois, Xenofonte e Maria retornaram do Jordão e dirigiram-se ao Gólgota. Após adentrarem a igreja e distribuírem ouro aos sacerdotes, reconheceram o ancião — o qual novamente estava com os dois irmãos na igreja —, caíram aos seus pés e pediram por suas orações. Depois, disseram: “Pelo amor de Deus, pai, cumpre tua promessa e mostra-nos onde podemos encontrar nossos filhos!” João e Arcádio já haviam sido instruídos pelo ancião a não levantar seus olhos ou respondê-los, e nem puderam ser reconhecidos pelos pais devido à aparência a qual o modo de vida austero os havia deixado.
O ancião orientou Xenofonte e Maria que preparassem uma refeição a ele e seus discípulos no alojamento onde estavamabrigados. Em seguida, ele os diria onde estavam seus filhos. Ambos concordaram e correram para preparar o jantar, e o ancião tornou a dizer aos jovens para que não dissessem nada durante a ceia. “Jantar e conversar com vossos pais não porá em perigo vossa salvação. Acreditai-me, tudo o que vós fizerdes em nome da virtude jamais se igualará à estatura espiritual de vossos pais.”
Após a ceia, Xenofonte e Maria tornaram a perguntar como iam seus filhos, e ele os respondeu que eles labutavam corajosamente por sua salvação. Xenofonte, maravilhado, disse: “Que Deus, por Quem todos os homens são salvos, faça-os trabalhadores determinados na videira de Cristo. E quão admiráveis são os teus discípulos, pai, oxalá nossos filhos fossem como eles! Assim que pusemos os nossos olhos nesses jovens monges, nossos corações se rejubilaram e nós os amamos como nossos próprios filhos.”
11 779
edições

Menu de navegação