Perpétua de Cartago

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A Santa Mártir Perpétua de Cartago e seus companheiros (os quais, Felicidade, Sátiro, Revogado, Saturnino e Segundo; m. 203) foram martirizados sob Sétimo Severo na África. Sua história foi composta tanto por ela própria em seu diário como por uma testemunha de seu martírio. A Igreja celebra sua memória no dia 1º de fevereiro.

Vida

Víbia Perpétua nasceu de uma rica família pagã em Cartago na África com outros dois irmãos em c. 181, na era do santo Papa Eleutério de Roma. Em sua juventude, recebeu uma excelente educação, casou-se e teve um filho. Pouco tempo depois, seu esposo faleceu, e Perpétua passou a crer em Jesus Cristo aos vinte e dois anos de idade, sendo logo capturada e enviada à prisão junto com seu filho de um ano. Naquele tempo, o Imperador Sétimo Severo (193–211) havia publicado um édito que proibia a conversão ao cristianismo no império. Acompanharam-na no cárcere um de seus irmãos, Sátiro, e seus servos Felicidade, Revogado, Saturnino e Segundo.

Mesmo com seu pai apelando aos seus sentimentos maternais, a viúva recusou-se a oferecer sacrifícios aos deuses pagãos. Aos seus apelos, Perpétua disse: “Pai, vês este jarro no chão? Pode ele ser chamado de qualquer outro nome que não corresponda ao que ele é? Pois bem, da mesma forma não me posso chamar de outra coisa que não seja o que sou, uma cristã.” Seu pai, então, atirou-se sobre ela com raiva e, dominado pelos argumentos do diabo, foi-se embora da prisão.

Na prisão, ministravam os diáconos Tércio e Pompônio. Foi através deles que Perpétua aceitou o santo Batismo, e seus cinco companheiros aceitaram tornar-se seus catecúmenos. Os diáconos também conseguiram fazer com que eles fossem retirados da temível masmorra e levados para uma parte mais aberta da prisão, onde Perpétua conseguiu amamentar seu filho enfraquecido pela fome e consolar sua família.

De volta à masmorra, Deus fortaleceu seu corpo e aliviou-a da ansiedade por seu filho, de forma que a fria e escura masmorra tornou-se como um palácio à viúva. Sátiro disse: “Minha querida irmã, já te encontras numa posição de grande dignidade, e acredito que podes pedir por uma visão, para que saibamos se nosso destino será a paixão ou a fuga.”

Perpétua acatou sua sugestão e, em sonho, viu uma escada dourada tão alta que ultrapassava as nuvens, porém tão estreita que as pessoas só poderiam subi-la uma a uma. Afixados aos lados da escada, haviam todos os tipos de armas: espadas, lanças, garras e punhais, de forma que quem subisse-a descuidosamente e sem olhar para trás fosse despedaçado pelas armas. Debaixo da escada, havia um dragão de tamanho inigualável que tentava amedrontar a todos os que ascendiam a escada.

Sátiro foi o primeiro a subir e, chegando no topo, disse: “Perpétua! Estou esperando por ti, mas toma cuidado para que não te sejas mordida pelo dragão.” Repetindo o Nome de Jesus Cristo, a viúva dirigiu-se à escada, e pisou na cabeça do dragão acoado enquanto subia os degraus. Quando chegou lá em cima, Perpétua viu um imenso jardim, e no meio dele havia um Homem de Cabelos brancos e alta estatura. Ele estava sentado com roupas de pastor ordenhando Suas ovelhas, e ao Seu redor haviam milhares de seres de vestes brancas. Ao levantar Sua Cabeça, o Homem olhou para a viúva e chamou-a: “Minha filha, tu és bem-vinda.”

Quando Perpétua se aproximou, o Homem transformou o leite ordenhado em queijo e deu-a. Ela comeu, e todos os que estavam ao redor disseram: “Amém.” À essa palavra Perpétua despertou e, ainda com o gosto em sua boca, correu para relatar o sonho ao seu irmão. Ambos entenderam que havia de ser uma paixão, e deixaram de ter quaisquer esperanças neste mundo.

Alguns dias depois, soube-se que os confessores estariam prestes a serem interrogados. Ao saber da notícia, seu pai correu até a prisão e, exausto, beijou suas mãos, jogou-se aos seus pés e em lágrimas clamou: “Minha filha, tem piedade dos meus cabeços grisalhos, tem piedade de teu pai, se é que ainda sou digno de ser chamado assim por ti! Se estas minhas mãos trouxeram-te até a flor da idade, se eu te preferi a todos os teus irmãos, não me entregues ao escárnio dos homens. Tem consideração pelos teus irmãos, tem consideração pelas tuas mãe e tia, tem consideração pelo teu filho que não poderá crescer contigo! Despoja-te desta tua coragem e não nos traga a destruição, pois todos nós seremos cativos em teus sofrimentos.” Perpétua chorou, não por suas palavras, mas por ser o único de sua família que não se regozijaria com sua paixão. Ela confortou-o, dizendo: “Naquele cadafalso, o que Deus quiser acontecerá. Não somos colocados em nosso próprio poder, mas no de Deus.” E seu pai partiu amargurado.

Condenação

Noutro dia, enquanto estavam jantando, foram subitamente levados para o interrogatório no centro da cidade. A notícia chegou a toda a vila, e diversas pessoas reuniram-se ao redor deles. Era 203, e o procônsul da África Minício Opimiano havia acabado de morrer; assim, Hilarião, o procurador, tomou o poder de decidir entre a vida e a morte dos julgados. Quando todos os outros já haviam sido interrogados, Hilarião chamou-a, e seu pai apareceu diante dela com seu filho, suplicando: “Tem piedade do teu menino!”

Hilarião, vendo-os, disse: “Poupa os cabelos brancos do teu pai, poupa a infância do teu filho. Oferece o sacrifício para o bem-estar dos imperadores.” Ela respondeu: “Não o farei.” O procurador perguntou se ela era cristã, e ela afirmou. Hilarião, então, atirou seu pai ao chão, e ordenou que fosse espancado com bastões. A dor de seu pai refletia-se nela como se ela mesma estivesse sendo agredida. Em seguida, o procurador condenou que os seis seriam futuramente jogados aos animais selvagens, e foram levados para uma prisão improvisada.

Alguns dias depois, enquanto oravam, veio à mente de Perpétua Dinócrates, seu esquecido e miserável irmão que faleceu aos sete anos de idade vítima de um câncer. Perpétua lamentou-se e sentiu a dignidade de ter sido preservada da doença por Deus; assim, começou a suplicar e chorar por seu falecido irmão a Deus.

Naquela mesma noite, o Altíssimo concedeu-a mais uma visão, e nela Perpétua via Dinócrates saindo de um lugar sombrio e nebuloso junto a várias outras pessoas. Sua pele estava ressecada de tamanha sede, e sua face, pálida, encardida e com o rosto devorado pelo tumor. Entre os dois, havia um hiato para que nenhum pudesse se aproximar do outro. Em frente a Dinócrates havia um tanque cheio de água, e ele esforçava-se para alcançá-lo, mas sua altura era menor que a do tanque. O sofrimento de seu irmão era perceptível à viúva, mas sabia que somente sua oração traria ajuda a ele, de forma que seu nome esteve presente em suas orações por todos os dias que se seguiram.

Em 7 de março de 203, aniversário de Geta, filho de Sétimo Severo e futuro imperador, Perpétua persistiu em oração o dia inteiro, lamentando-se e gemendo por seu irmão. De noite, teve uma nova visão: a escuridão havia sido dissipada pela luz, e Dinócrates estava completamente limpo. O tanque tinha diminuído de tamanho até a cintura de seu irmão, e no lugar do tumor havia apenas uma cicatriz. Alguém tirava a água incessantemente, e uma taça estava na beira do tanque; Dinócrates bebeu-a por completo, saciou-se, e afastou-se para brincar à maneira das crianças. Assim, Perpétua entendeu que o menino havia sido poupado da punição.

Pudêncio, um soldado da prisão, começou a ter grande estima para com os confessores e, percebendo a presença de Deus neles, permitiu que pessoas de fora pudessem se encontrar com eles. Uma dessas pessoas foi novamente seu pai que, desgastado de sofrimento, jogou-se perante a filha, começou a arrancar sua barba e disse palavras capazes de comover toda a criação. Perpétua novamente entristeceu-se, mas isso não a convenceu de desistir.

A última visão

Na noite anterior ao juízo no anfiteatro, Perpétua viu Pompônio bater forte na porta da prisão. Ela abriu a porta ao diácono, o qual estava vestido com um manto branco e sandálias, ambos ricamente ornamentados, e disse: “Perpétua, estamos à tua espera, vem!” Então, segurou a mão dela e levou-a a lugares perigosos e sinuosos até chegar ao centro do anfiteatro. “Não temas, estou contigo e irei te ajudar!”, e partiu. Nas arquibancadas, havia um número esplêndido de espectadores, todos aterrorizados com um egípcio de aparência horrível e seus companheiros, ambos prestes a confrontá-la. Ela não estava sozinha, várias crianças começaram a ser juntar a ela, despi-la e esfregar óleos em seu corpo, como era costume aos gladiadores. Quando viu, não era mais uma mulher, mas sim um gladiador.

Então, um homem mais alto que o anfiteatro inteiro apareceu. Ele vestia uma túnica e um manto púrpura entre duas faixas que cruzavam seu peitoral, além de duas sandálias de prata e ouro. Ele carregava um bastão, simbolizando o treinador dos gladiadores, e um ramo verde sobre o qual pendiam maçãs douradas. Houve um silêncio, e ele disse: “Este egípcio, se vencer esta mulher, mata-la-á à espada; essa mulher, se o vencer, receberá o ramo.” E então, desapareceu.

“Esta te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar.” (Gênesis 3:15)

Ambos começaram a se enfrentar. Perpétua golpeava o rosto do egípcio com seu calcanhar, enquanto este tentava feri-lo; ela foi jogada ao ar e, segurando-se nele, espancou-o até chegar ao chão. Finalmente, empurrou-o com a cara no chão e pisou sobre sua cabeça. A arquibancada gritava de louvor, e as crianças exultavam. O treinador apareceu a ela e deu-lhe um beijo, dizendo: “Minha filha, a paz esteja contigo.” Ele entregou-a o ramo e ela dirigiu-se gloriosamente até o portal dos sobreviventes. E acordou. A viúva entendeu que ela não havia de lutar com as bestas selvagens, mas com o próprio diabo. Mesmo assim, sua vitória seria certeira.

Naquela mesma noite, Sátiro também teve uma visão enquanto dormia. Todos já haviam sofrido nas mãos dos torturadores, e seus espíritos estavam sendo carregados por quatro anjos em direção ao oriente. Suas mãos, entretanto, não os tocavam, mas seus corpos subiam suavemente. Quando já estavam afastados do mundo, passaram a ver uma imensa região de luz, e Sátiro disse a Perpétua, que estava ao seu lado: “Isto é o que o Senhor nos prometeu. Nós recebemos Sua Promessa.”

Os mártires continuaram subindo e aproximando-se da luz, até começarem a ver um vasto jardim, cheio de árvores floridas e flores de todas as espécies. As árvores eram imensas, altas como ciprestes, e suas folhas caíam incessantemente. Outros quatro anjos ainda mais radiantes e gloriosos os viram, prestaram-lhes honras e disseram aos outros: “Aqui estão eles! Aqui estão eles!” Os quatro anjos que os levavam temorosamente puseram-nos no chão, e os mártires começaram a andar por um longo caminho. Durante a caminhada, encontraram Jocundo, Saturnino e Artáxio, queimados vivos sob a mesma perseguição, e Quinto, martirizado dentro da prisão. Perguntaram-lhes onde estavam seus outros companheiros mas, antes que pudessem ser respondidos, os anjos disseram-lhes: “Vinde primeiro, entrai e saudai vosso Senhor.”

Quando chegaram ao fim do caminho havia uma edificação, cujas paredes eram tais como se fossem construídas de luz; e diante da porta haviam outros quatro anjos que vestiam aqueles que adentravam o lugar com mantos brancos. Após serem vestidos, os mártires entraram com muita admiração e viram a luz plena. Ouviam vozes que diziam sem cessar: “Santo, Santo, Santo!” E no meio daquele lugar viam um Ancião sentado, de Cabelos brancos como a neve e com um jovem Rosto. À Sua direita e à Sua esquerda estavam vinte e quatro outros anciãos e, atrás deles, muitos outros.

Os mártires apresentaram-se perante Seu Trono, e os anjos levantaram-nos até o Ancião. Eles O beijaram, e Ele passou Sua Mão sobre os seus rostos. Os outros anciãos disseram-lhes: “Levantemo-nos”, e beijaram-se uns aos outros. Em seguida despediram-nos: “Ide e desfrutai.” Sátiro disse: “Perpétua, tens o que desejas.” E ela: “Graças a Deus, que, assim como eu estava em carne, ainda mais alegre estou aqui, em espírito.”

Enquanto saíam do majestoso lugar, viram o bispo e o presbítero Aspásio, e ambos estavam cabisbaixos. Eles se jogaram aos seus pés e os disseram: “Restaurai a paz entre nós, porque vós se fostes e nos deixastes assim!” Perpétua espantou-se com a ação e retrucou: “Não sois vós nosso pai e nosso presbítero para vos lançardes aos nossos pés?” Eles se prostraram, os abraçaram e sentaram-se abaixo de uma árvore do jardim para conversar. Logo em seguida, os anjos apareceram perante eles e disseram: “Deixai-os em paz para que se revigorem. Se tiverdes alguma dissensão entre vós, perdoai-os uns aos outros. Repreende o teu povo, porque vêm a ti como se tivesse voltado de um circo, e disputam sobre assuntos mundanos.” E os expulsaram como se tivessem fechado as portas daquele Paraíso. Naquele lugar, começaram a reconhecer diversos companheiros de prisão martirizados. Um aroma indescritível os servia de alimento e os satisfazia. Então, Saturnino acordou — com grande alegria.[nota 1]

Testemunho

“Esses foram os atos de meu martírio até o dia anterior aos jogos. Para os atos do dia dos jogos, deixo que outro faça o relato se achar apropriado.”

Assim foi o fim do diário de Santa Perpétua, escrito em primeira pessoa até o seu último dia na prisão. O restante do registro de suas vidas foi escrito pelas testemunhas de seu martírio. São Segundo foi martirizado à espada enquanto ainda estava na prisão, sendo poupado das bestas selvagens. Quanto a Felicidade, esta estava gestante de oito meses, e lamentava-se pois, pela lei, não poderia ser punida. Além disso, seus companheiros também entristeceram-se por deixar uma tão grande amiga sozinha no caminho da mesma esperança. Assim, unindo suas súplicas, todos derramaram suas orações a Deus durante três dias (o martírio aconteceria no quarto). No último dia, as dores de parto milagrosamente recaíram sobre Felicidade.

Seu trabalho de parto foi sofrido e doloroso, e Santa Felicidade parecia não aguentar mais. Alguns dos guardas inferiores da prisão disseram: “Tu, que agora estais em tal sofrimento, que farás quando fores lançada aos animais os quais tu desprezaste quando não sacrificaste aos deuses?” E ela: “Eu agora sofro o que eu sofro [viz. o sofrimento do meu sexo], mas naquele dia haverá Alguém dentro de mim para suportar a dor em meu lugar, porque eu estarei sofrendo por Ele.” Assim Felicidade deu a luz a uma menina, que foi criada a partir de então por uma piedosa cristã como se fosse sua própria filha.

Alguns dias antes, devido a um falso alerta de que os cinco confessores restantes poderiam ser abduzidos da prisão por alguma espécie de feitiço, a prisão havia entrado em cárcere severo. Diante disso, Perpétua encarou o juiz da prisão e disse: “Por que não nos permite espairecer de vez em quando? Não somos os mais célebres entre os criminosos? Acaso não somos importantes até para César [Geta], em cujo aniversário enfrentaremos os animais? Não seria melhor para tu se nos apresentasse naquele dia com uma aparência não tão deplorável?” O juiz envergonhou-se e, horrorizado, ordenou que os confessores fossem tratados de maneira mais gentil. Assim, a entrada da prisão foi aberta, e eles puderam espairecerem com os livres. A essa altura, até o chefe dos carcereiros já havia secretamente se convertido a Cristo.

Na véspera dos jogos, quando ceavam sua última refeição (chamada de banquete gratuito ou liberal), tentaram transformar a ceia num ágape. Com a mesma firmeza de sempre, trocavam palavras com quem participava da mesa, alertando-os acerca do Juízo e testemunhando sua alegria no sofrimento. Sátiro censurava-os: “Acaso o dia de amanhã não será suficiente para vós? Por que estais tão ávidos por observar estupefatos aqueles que vós odiais? Hoje sois nossos amigos, amanhã, nossos inimigos! Prestai, entretanto, bastante atenção ao nosso rosto, para poderdes reconhecer a cada um de nós no grande dia.” Com isso, todos saíram perplexos da prisão, e muitos se converteram a Cristo.

Anfiteatro

O dia da vitória raiava, e os confessores dirigiram-se da prisão para o anfiteatro trêmulos de alegria e resplandescentes. Perpétua avançava a passos calmos, como uma verdadeira esposa de Cristo, amada por Deus. A expressão viva de seus olhos desviava os olhares de todos. Felicidade, que a acompanhava, regozijava-se por estar liberta de seu fardo e capaz de lutar contra as bestas, das quais havia de passar de um tipo de derrame de sangue para outro.

Quando chegaram aos portões do anfiteatro, foram obrigados a vestir trajes pagãos: Sátiro, Revogado e Saturnino como sacerdotes do deus Saturno e Perpétua e Felicidade como sacerdotisas do deus Ceres. Perpétua recusou-se: “A razão pela qual viemos por nossa livre vontade foi para que nossa liberdade não fosse violada. Oferecemos nossa vida para que vós não nos imporíeis nada. Tínhamos um acordo com vós!” O ímpio juiz reconheceu a justiça, e permitiu que adentrassem a arena com suas roupas. Perpétua adentrou cantando os Salmos, enquanto Sátiro, Revogado e Saturnino alertavam a multidão do Juízo de Deus. Na presença de Hilarião, o procurador, disseram através de gestos: “O que condenardes, Ele há de condenar-te.”

A multidão enfureceu-se, e exigiram que fossem flagelados pelos torturadores. E os mártires deram graças a Deus por poderem participar de Seus Sofrimentos; Ele quem dissera “Pedi e recebereis” (João 16:24) lhes deu, conforme pediram, o padecimento que cada um havia desejado. Em seguida, Saturnino e Revogado tiveram que enfrentar um leopardo. Não sendo derrotados, foram amarrados num tablado para serem feridos até a morte por um urso, e assim entregaram suas almas a Cristo. Sátiro, por sua vez, foi amarrado a um javali, o qual acabou matando um torturador logo que foi solto e não arrastou Sátiro de forma que ele se ferisse. Então, amarraram-no e abriram a jaula do urso, mas este recusou-se a sair dela. Por isso, Sátiro foi levado de volta à cela sem ferimentos.

O uso deste animal na arena era inédito até então, mas assim foi para que Hilarião rivalizasse-as em seu sexo: as duas jovens tiveram que lidar com uma vaca. Ambas haviam sido despidas no torso, mas como Felicidade havia acabado de amamentar, as autoridades cobriram-nas com túnicas. A vaca começou a atacar Perpétua, que ao final caiu já com seu manto rasgado. Como a viúva preocupava-se mais com a decência do que com a dor, rapidamente ajeitou seus trapos para que cobrissem seu quadril. Amarrou também seus cabelos despenteados, para que não a dessem uma aparência de luto, mas sim de glória. Quando viu, Felicidade estava ferida e contorcida no chão com os golpes que a vaca lhe deu. Rapidamente correu à companheira, levantou-a e ambas ficaram juntas uma da outra. O ânimo dos espectadores apaziguou-se, e as duas foram chamadas à cela novamente.

Na era de São Zeferino, Papa de Roma.

Notas

  1. Os manuscritos mencionam o nome do bispo como sendo Optato. De fato, Santo Optato foi Bispo de Milevo na África, há menos de quatrocentos quilômetros de Cartago, porém no final do século IV, centenas de anos após o martírio de Santa Perpétua e seus companheiros. Santo Optato foi um fiel defensor da Ortodoxia que, juntamente com Santo Agostinho, Bispo de Hipona (390–430), distinguiu-se por seus escritos contra a heresia donatista, que posteriormente levou a um cisma na Sé de Cartago até a queda da África ao islã no século VII. Por conta disso, é provável que seu nome tenha sido usado como uma metonímia à Igreja de Cartago.

Referências

  • São Nicodemos, o Hagiorita (1819). Sinaxário dos doze meses do ano. Tomo segundo.

Ligações externas